Grande Manifesto
"O amor é o grande manifesto; a urgência de ser, de ter alguma importância e, se a morte vier, morrer com valentia, com clamor – em suma, permanecer na memória."
Cesare Pavese
Não quero algo vazio e sem sentimentos, só porquê daqui a pouco vamos morrer. Quero algo intenso, fluído, colorido, justamente porquê daqui a pouco vamos morrer. Tudo e nada coexistem no vazio preenchido pelo meu próprio sentir, limitado pelo meu próprio existir. Continuo a busca, molhando os pés na poça de água da chuva, e é intenso. Sinto a necessidade de ser e existir arder em meu peito, e dói, dói como a dor de um parto, como a dor da limpeza da ferida que infeccionaria. Sim, o Grande Manifesto me impusiona e me lança para a frente, mas sinto meu corpo se partir e se fragmentar pois meus pés não se movem. Correntes de tristeza e melancolia serpenteiam em minhas pernas, e posso sentir suas escamas. Me ofereçam o fruto do pecado e o recusarei, por pura conveniência, pura preguiça. Do desgaste do amor, do afiamento do ódio, a destilação do tom púrpura entendiante das madrugadas frias como esta em que escrevo. Frias e insones, eu digo, pois já não posso dormir. Meu olhos são como brasa percorrendo a escuridão e as luzes da cidade vista de cima, procurando um rosto que nunca vi, ou que talvez não me lembre.
Sim, sim, é tanto possível perder quanto é possível ganhar. O espectro de possibilidades me assusta, e o conceito de liberdade me fascina. Me embebedarei pela manhã e cantarei pela cidade à tarde, me declarando para os prostitutos dos livros e me enamorando das poesias boêmias. Um brinde à sociedade fracassada, perdida e doentia, solitária em suas próprias conexões e redes. Quando a noite chegar, deitarei na relva e olharei as estrelas, e me perguntarei se elas riem para os outros como riem para mim, me perguntarei se o carneiro comeu a flor. E escreverei os bilhetes suicidas dos que ainda não nasceram. Os imprimirei nas estrelas, para os filósofos e astrólogos que hão de vir os estudarem e ignorarem. Beijarei a mãe terra, tão erma e especial, e lembrarei que a ela se chama mãe pois nos acolhe a todos sem exceção, até que acolhe em termos fúnebres porém luxuosos e limpos; basta porém que se passe o tempo, e nos serve aos vermes para liberar espaço dentro de si, dentro de sua alma orgânica e calorenta, e posso sentir o nitrogênio e o carbono se despedindo do cálcio de meus ossos.
Rezo à todos os deuses que me livrem de todos os infernos, mas nenhum me livrou ainda do inferno que é viver. Desde quando abrimos os olhos para a vida vem a contagem regressiva para os fechar na morte. E medo do fim impresso no subconsciente de cada ser humano nos provoca um pavor ao vazio, e comicamente me sinto confortável nesse limbo de não existência. Mas a sociedade odeia o que não está preenchido, e talvez tenha fé de que preencher mal é melhor que não preencher. O homo sapiens ocupa o seu tempo com os hobbies e trabalhos, ocupa sua alma com a fé e a doutrina e os dogmas, ocupa seu lar com indivíduos e objetos e ocupa o seu mísero coração vazio e superficial com os sentimentos, o ódio sim, mas acima de todos o amor. Amor que encanta, machuca e inspira os poetas desde a invenção da escrita. Talvez a primeira história vivida no mundo seja sobre amar - ou sobre odiar, são inseparáveis visões de uma mesma realidade. Amor que abre as portas e abaixa as defesas, que nos faz hesitar em puxar o gatilho, em brandir a lança. Amor que nos faz ser machucados mais por aqueles que amamos. O pior de tudo? Sabemos disso. No fim, todos sabemos. Por isso sempre hesitamos em apaixonar-se, em demonstrar amor. O sentimento abre a porta da sua subjetividade para a outra pessoa entrar, mas isso nunca impediu que ela usasse o vão livre da porta para atirar coisas em você ou te golpear. Cansados da superficialidade, nos lançamos de braços abertos, mergulhamos fundo dentro do sentir, pois só é possível estar imerso no amor.
Entendiado pelo sopro cálido, lânguido e morno que acaricia meu rosto, resta arrepiar-me, de medo, frio, presságio talvez. Tudo importa e nada importa, ao mesmo tempo. Acordo do devaneio sobressaltado, procurando um rosto na cama ao meu lado. E percebo que só o vejo no espelho embaçado do meu banheiro, olheiras marcadas, cabelo bagunçado, olhar perdido. Ali está o que preciso, ali está o nós decisivo, o começo e o fim do infinitos eu's. O começo e o fim da vida, e do amor e do ódio e da música e da cafeína e da letargia em minhas veias. E ali recomeça, morre e nasce a busca pelo Grande Manifesto. De novo e de novo em algum lugar entre a combustão da vida e nas cinzas da morte.
Não quero algo vazio e sem sentimentos, só porquê daqui a pouco vamos morrer. Quero algo intenso, fluído, colorido, justamente porquê daqui a pouco vamos morrer. Tudo e nada coexistem no vazio preenchido pelo meu próprio sentir, limitado pelo meu próprio existir. Continuo a busca, molhando os pés na poça de água da chuva, e é intenso. Sinto a necessidade de ser e existir arder em meu peito, e dói, dói como a dor de um parto, como a dor da limpeza da ferida que infeccionaria. Sim, o Grande Manifesto me impusiona e me lança para a frente, mas sinto meu corpo se partir e se fragmentar pois meus pés não se movem. Correntes de tristeza e melancolia serpenteiam em minhas pernas, e posso sentir suas escamas. Me ofereçam o fruto do pecado e o recusarei, por pura conveniência, pura preguiça. Do desgaste do amor, do afiamento do ódio, a destilação do tom púrpura entendiante das madrugadas frias como esta em que escrevo. Frias e insones, eu digo, pois já não posso dormir. Meu olhos são como brasa percorrendo a escuridão e as luzes da cidade vista de cima, procurando um rosto que nunca vi, ou que talvez não me lembre.
Sim, sim, é tanto possível perder quanto é possível ganhar. O espectro de possibilidades me assusta, e o conceito de liberdade me fascina. Me embebedarei pela manhã e cantarei pela cidade à tarde, me declarando para os prostitutos dos livros e me enamorando das poesias boêmias. Um brinde à sociedade fracassada, perdida e doentia, solitária em suas próprias conexões e redes. Quando a noite chegar, deitarei na relva e olharei as estrelas, e me perguntarei se elas riem para os outros como riem para mim, me perguntarei se o carneiro comeu a flor. E escreverei os bilhetes suicidas dos que ainda não nasceram. Os imprimirei nas estrelas, para os filósofos e astrólogos que hão de vir os estudarem e ignorarem. Beijarei a mãe terra, tão erma e especial, e lembrarei que a ela se chama mãe pois nos acolhe a todos sem exceção, até que acolhe em termos fúnebres porém luxuosos e limpos; basta porém que se passe o tempo, e nos serve aos vermes para liberar espaço dentro de si, dentro de sua alma orgânica e calorenta, e posso sentir o nitrogênio e o carbono se despedindo do cálcio de meus ossos.
Rezo à todos os deuses que me livrem de todos os infernos, mas nenhum me livrou ainda do inferno que é viver. Desde quando abrimos os olhos para a vida vem a contagem regressiva para os fechar na morte. E medo do fim impresso no subconsciente de cada ser humano nos provoca um pavor ao vazio, e comicamente me sinto confortável nesse limbo de não existência. Mas a sociedade odeia o que não está preenchido, e talvez tenha fé de que preencher mal é melhor que não preencher. O homo sapiens ocupa o seu tempo com os hobbies e trabalhos, ocupa sua alma com a fé e a doutrina e os dogmas, ocupa seu lar com indivíduos e objetos e ocupa o seu mísero coração vazio e superficial com os sentimentos, o ódio sim, mas acima de todos o amor. Amor que encanta, machuca e inspira os poetas desde a invenção da escrita. Talvez a primeira história vivida no mundo seja sobre amar - ou sobre odiar, são inseparáveis visões de uma mesma realidade. Amor que abre as portas e abaixa as defesas, que nos faz hesitar em puxar o gatilho, em brandir a lança. Amor que nos faz ser machucados mais por aqueles que amamos. O pior de tudo? Sabemos disso. No fim, todos sabemos. Por isso sempre hesitamos em apaixonar-se, em demonstrar amor. O sentimento abre a porta da sua subjetividade para a outra pessoa entrar, mas isso nunca impediu que ela usasse o vão livre da porta para atirar coisas em você ou te golpear. Cansados da superficialidade, nos lançamos de braços abertos, mergulhamos fundo dentro do sentir, pois só é possível estar imerso no amor.
Entendiado pelo sopro cálido, lânguido e morno que acaricia meu rosto, resta arrepiar-me, de medo, frio, presságio talvez. Tudo importa e nada importa, ao mesmo tempo. Acordo do devaneio sobressaltado, procurando um rosto na cama ao meu lado. E percebo que só o vejo no espelho embaçado do meu banheiro, olheiras marcadas, cabelo bagunçado, olhar perdido. Ali está o que preciso, ali está o nós decisivo, o começo e o fim do infinitos eu's. O começo e o fim da vida, e do amor e do ódio e da música e da cafeína e da letargia em minhas veias. E ali recomeça, morre e nasce a busca pelo Grande Manifesto. De novo e de novo em algum lugar entre a combustão da vida e nas cinzas da morte.
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